quinta-feira, 17 de outubro de 2013

A violência político-militar no Rio de Janeiro

Fico me perguntando qual o motivo da polícia militar - a despeito de ser militar - usar tanta violência contra os manifestantes. Alguns poderiam dizer, convictamente, que é tão-somente por causa de um grupo de vândalos. Dito isso, a resposta estaria dada e a violência justificada. Mas, supondo que isso encerrasse a questão, o uso excessivo da força policial não alarmaria a população por quê? Os moradores de Laranjeiras, por exemplo, já sofreram mais de uma vez e, principalmente, já presenciaram o que a polícia faz contra manifestantes ou não, Black Blocs ou não. A violência da polícia militar do Rio de Janeiro - a mais violenta do mundo - já não se restringe às favelas e/ou aos bairros do subúrbio, locais onde, desde sempre, a polícia fez o que quis porque, no final das contas, os mortos eram negros, pobres e, no frigir dos ovos, traficantes. Mais uma vez se justificaria a ação criminosa de nossa polícia, pelo menos aos olhos de uns. 
O que me surpreende mais não é a violência da polícia em si. Muito menos ela agora ser praticada, aos olhos de todos, no Centro da cidade e na zona sul. O mais espantoso é ainda haver um número grande de pessoas que se calam diante dos abusos cometidos. É claro que a mídia hegemônica vem cumprindo seu papel e alienando a população - que se deixa alienar, convenhamos. O discurso de que a Rede Globo e demais veículos midiáticos iludem seu público é verdadeiro, por um lado, mas extremamente paternalista, por outro. A internet está aí para mostrar um outro ponto de vista ao qual qualquer um pode ter acesso. As pessoas estão na rua dividindo experiências, basta se dispor a ouvir criticamente o que acontece, de ambos os lados, e deixar de ser refém da televisão. Basta abrir os olhos.
Voltando aos atos criminosos de nossa polícia nas favelas e comunidades mais carentes, sempre foram justificados porque eram uma resposta ao crime organizado. Bandido bom é bandido morto, dizem por aí. Nesse caso, nada mais lógico do que criminalizar os protestos. Pronto, os Black Blocs são vândalos, são criminosos que depredam fachadas de bancos e de lojas, chegam mesmo a quebrar pontos de ônibus, arrancar placas e lixeiras, além de atiçar fogo no lixo. E ainda usam máscaras, ícone máximo de que não são bem-intencionados. Está justificada a violência policial, portanto. Acontece que não é isso o que ocorre e vou dar a minha modesta opinião, que, para ser mais bem embasada, precisaria de muito mais espaço do que aqui disponho.
Para ficar apenas no que diz respeito à PM, falo como testemunha e participante de várias manifestações que ocorrem de junho para cá. É mentira que a polícia quer apenas dispersar os manifestantes, simplesmente porque ela os cerca e os ataca de todas as direções. Não há para onde correr, possibilidade de dispersão, ponto de fuga. Cinegrafistas e pessoas da imprensa alternativa são ostensivamente reprimidos, sem falar nos advogados. Ora, um país democrático garante a liberdade de imprensa, por que, então, deve-se reprimir os midialivristas nas ruas? Seria porque eles mostram o que a imprensa oficial esconde? Isso lembra que período da nossa história? Mais do que acabar com a manifestação, a impressão que se tem é que a intenção é acabar com os manifestantes. Depois, basta rotulá-los como vândalos, do mesmo modo que se rotulava o negro pobre de traficante. E aí ficam elas por elas. A polícia simplesmente cumpriu seu papel e o desconforto que as imagens podem causar desaparecem com os comerciais ou com a novela que vem a seguir. E se continua (sobre)vivendo normalmente no dia seguinte.
Todavia, a atitude da PM, por mais bárbara que seja, não é a mais preocupante. Simplesmente porque ela cumpre ordens. E ordens de um governador eleito e reeleito pelo voto direto, prática vigente nas democracias. Mas um estado que não permite oposição política e que volta, em muitos aspectos, a se comportar ditatorialmente está cometendo uma violência muito mais grave do que a da PM, sua subordinada. Não há diálogo, não há explicações convincentes, não há pronunciamentos televisivos - há apenas silêncio. O mesmo silêncio que grita de Brasília, capital de um país que tem como presidente uma mulher que lutou contra a ditadura militar. É muito triste um partido com a história do PT formar alianças que visam o interesse dos mesmos de sempre - a classe dominante. O trabalhador? Contenta-se, quiçá, com um trabalho que lhe permita pagar as contas no fim do mês, sem seus direitos básicos garantidos. 
Os professores, tanto do estado quanto do município, lutam pela educação. Mas educar para que o povo? É melhor que ele se contente com um poder de compra maior no fim do mês. Ensinar o povo a pensar é perigoso. Parece ser esse o raciocínio de nossos governador e prefeito. Este último, inclusive, já declarou que não matricularia seus filhos numa escola do município. Educação de qualidade para os filhos dos outros é luxo, não é direito, muito menos necessidade. E continua obstinado a não dialogar. E, com isso, o povo continua incansavelmente indo às ruas, com a mesma obstinação. Nesse ponto, fecha-se o círculo, pois a resposta é, novamente, a violência policial. A violência política, no final das contas, haja vista que vivemos hoje um estado de exceção no Rio de Janeiro. 
O povo não quer só vinte centavos. O povo quer educação, saúde, transporte público, segurança, moradia, alimentação, lazer padrão FIFA. O povo quer que Sérgio Cabral vá com Paes. A propósito, o que se espera tanto para votar seu impeachment? Mas isso já é outra história. A população do Rio de Janeiro não quer mais nosso governador no poder, e ele já demonstrou incompetência e motivos suficientes para ser retirado do cargo. Enquanto ele permanecer no Palácio Guanabara e, além disso e principalmente, as reivindicações populares não forem ouvidas, o povo voltará à rua, com repressão ou não.

domingo, 13 de outubro de 2013

Black Bloc e a discussão improfícua

Hoje o Fantástico apresentará uma matéria sobre os Black Blocs, com a entrevista de um dos integrantes da tática que assume a perda de controle nas manifestações. Naturalmente, qualquer pessoa com o mínimo de senso crítico não irá aceitar como "verdade" o que for veiculado pela Rede Globo, haja vista o grau de descompromisso com a imparcialidade da emissora. Desconfio, inclusive, ser de fato um Black Bloc a dar a entrevista. Não pretendo, com isso, dizer que os Black Blocs devem ser aceitos por todos e quem os critica ou é reacionário ou fascista ou de direita. Mas mesmo as pessoas que discordam dos Black Blocs sabem que não é possível confiar na emissora dos Marinho. Suas críticas podem ser justificadas por outros caminhos, menos pela alienação.
O que me chama a atenção ainda hoje, de forma bastante negativa, é a crescente polarização das manifestações entre violência da polícia de um lado e quebra-quebra de uns "vândalos", de outro. Quando o "gigante acordou", a população ia às ruas reivindicar o que lhe é de direito: saúde, educação, transportes, segurança, alimentação, moradia, empregos padrão FIFA. O país do futebol não quer mais ser o melhor nas quatro linhas e permanecer sem condições mínimas de uma vida digna. O dinheiro gasto nos estádios não seria melhor empregado para o bem-estar dos brasileiros, que sofrem em filas de hospitais com atendimento precário, por exemplo?
Diante do descontentamento explícito dos brasileiros, a primeira conquista chegou: a redução dos vinte centavos nos transportes públicos. Mas não eram só os vinte centavos que estavam em jogo. O que foi feito? Uma velha arma foi posta em circulação antes que novas conquistas surgissem por conta da pressão popular. Criou-se um novo problema para suplantar a causa primeira das manifestações. Assim, ao invés de discutir as políticas públicas deficitárias, começou a discussão sobre quem é mais violento: polícia ou manifestantes. E a cada dia que passa ambos os lados gastam tempo e energia para provar quem é mais violento e/ou quais são as melhores formas de reivindicação. Enquanto isso, nossos governantes permanecem sem dar as caras em público e sem serem efetivamente incomodados. 
Eu mesmo tenho perdido precioso tempo dialogando com pessoas que nunca foram às manifestações mas que têm teorias para tudo o que acontece. Nenhum problema com as teorias contrárias às minhas, mesmo porque não sou dono de verdade alguma, mas toda a discussão gira em torno de seu próprio rabo e não avança: sim, os Black Blocs são vândalos e utilizam máscaras porque têm algo a esconder; não, foi o Batalhão de Choque do governador que mais uma vez provocou o conflito, está filmado, todos podem ver. E enquanto não há vencedores nessa disputa retórica, o padrão FIFA restringe-se apenas aos nossos estádios de futebol.
Mesmo com toda essa discussão muitas vezes improfícua, ainda assim conseguimos avançar em alguns pontos: recentemente foi concedida liminar suspendendo a votação do plano de carreira dos professores, por exemplo; mais e mais a sociedade civil tem se organizado em coletivos dispostos a lutar por suas ideologias; até mesmo a Rede Globo se viu obrigada a mostrar um lado da história que vinha sendo escamoteada deliberadamente; vozes até então nunca ouvidas passaram a ser representadas e representativas.
Eu tenho participado ativamente das manifestações nas ruas e também sou um dos que têm perdido tempo na discussão sobre os Black Blocs nas redes sociais. E estou cansado disso. Ora, discordar da tática dos mascarados e aceitar a nossa política pública são coisas diversas. Ok, discorde, mas qual a proposta que você tem a oferecer para que a voz do povo seja ouvida? Será que estamos tão habituados a não termos nada que a violência da PM em favelas não nos incomoda, pois sempre foi assim mesmo? Que passar horas na fila de atendimento ou morrer num hospital sem nem sequer ter uma maca para deitar já é parte da rotina? Que dia após dia ficar parado na SuperVia por carência de trens não chega a ser um problema porque não atinge a classe média? 
Particularmente, não tenho nada contra os Black Blocs, apesar de ter alguns senões sim, mas me sinto muito mais seguro na companhia deles nas ruas. Mesmo que eu admitisse, hipoteticamente, que eles são baderneiros e que têm como único objetivo vandalizar a cidade, significa dizer que, na ausência deles, não temos do que reclamar? Nenhum manifestante é causa do problema, mas sim sua consequência. Vamos parar de correr atrás do próprio rabo e continuar a exigir saúde, educação, transporte, segurança, alimentação, moradia, desmilitarização da polícia etc. etc. O país não está em crise por causa das manifestações; estas existem porque o país está em crise. Para finalizar, quem tem coragem de dizer que, se não houvesse Black Blocs, não teríamos do que reclamar?

sexta-feira, 4 de outubro de 2013

Dois breves comentários pontuais sobre as manifestações

De junho para cá, as manifestações tomaram conta do país e seguem com força, principalmente no Rio de Janeiro. O povo não estava interessado apenas na revogação do aumento de 20 centavos nas passagens dos transportes públicos. Seu interesse ia - e vai - além, mesmo que os 20 centavos tenham sido apenas a gota d'água. Cientistas políticos e sociais e intelectuais de um modo geral buscaram compreender o fenômeno, mas não conseguiram, ainda hoje, de modo satisfatório. E na incompreensão, muita gente opinou. Uma das teorias mais correntes era a de que os Black Blocs e o Anonymous não passavam de grupos fascistas, interessados ou num golpe militar ou na desmoralização do PT para a retomada do poder, nas próximas eleições, pelo PSDB.
Sobre um possível golpe militar orquestrado pelos jovens vândalos, porque mascarados, acredito que não há mais quem sustente essa hipótese, tamanho o absurdo. Mas se o tópico é ditadura, vamos pensar sobre o que ocorre aqui no Rio de Janeiro de uns meses para cá. A polícia militar, a cada dia que passa, sob o comando do governador Sérgio Cabral, a pretexto de manter a ordem nas ruas, tem reprimido violentamente qualquer manifestação que se oponha ao governo. Ruas são fechadas e nem mesmo moradores podem escolher o percurso que lhes convém para chegar em casa. Isso aconteceu no Leblon - quando a polícia militar estava claramente protegendo bens privados - e em Laranjeiras, bairro sede do Palácio Guanabara - isso para não falar no casamento da Dona Barata e no recente fechamento da Cinelândia (!). Não apenas o direito de ir e vir da população foi cerceado; seu direito de se manifestar, de demonstrar descontentamento com a política atual e de fazer, portanto, oposição também foi extinto. Nas manifestações, bombas de efeito moral, de gás lacrimogêneo, balas de borracha, cassetetes e spray de pimenta (em alguns casos munição letal também), em grande quantidade e de forma covarde e arbitrária, são utilizados para que os manifestantes não se manifestem; policiais se misturam ao povo para iniciar confusões e criminalizar os protestos; pessoas são presas arbitrariamente, sem qualquer justificativa; "provas" são forjadas para justificar detenções; advogados são impedidos de trabalhar e impedir que jovens sejam injustamente encarcerados; a mídia alternativa é igualmente perseguida e ameaçada para que não registre a truculência empregada pela polícia de Cabral; e a grande imprensa ou se cala ou manipula as informações. Quem presenciou o que acontece quando o Batalhão de Choque se dispõe a cumprir as ordens do governador, seja pela imprensa alternativa seja nas próprias manifestações, tem a certeza, hoje, de que não havia risco de ditadura - ela já existe. Vivemos hoje um Estado de exceção, sem sombra de dúvida. E muita gente se mostrava contrária aos protestos receosos de reviver os anos de chumbo da ditadura militar, talvez ajudando e fortalecendo o governo, mesmo que indiretamente. 
Quanto ao segundo tópico - a retomada do poder pelo PSDB -, não tenho muito o que dizer, exceto o que me parece óbvio. Em primeiro lugar, se realmente houvesse, no meio da multidão, partidários da direita e simpatizantes dos tucanos, por que isso deslegitimaria os protestos? Numa democracia todos têm o direito de se manifestar, ou não? Por que o PT deveria estar a salvo de qualquer crítica que lhe fosse feita? Devo acreditar que o país, graças ao Partidos dos Trabalhadores (nome hoje irônico para a estrela vermelha), está tão bom que seria um gesto de vandalismo se posicionar de forma contrária? E mesmo que estivesse, a oposição deveria ser banida? Qual o nome que se dá a isso? A meu ver, deveria ser feito um mea culpa pelos defensores do PT e o porquê de suas ressalvas às manifestações. Não acredito que a maioria das pessoas nas ruas eram de direita, embora elas também pudessem estar presentes, mas para quem defendia que o povo na rua equivalia a uma desmoralização do PT, o que respondo é que, infelizmente, foi o próprio PT que se desmoralizou. Quando finalmente Lula chegou ao poder, o Brasil teve a grande chance de se firmar como um país de esquerda, mas não foi isso o que ocorreu. As alianças equivocadas assumidas em nome da governabilidade atendiam a quais interesses? E de quem? Enumerar as causas do desgaste que o PT sofre por causa de suas escolhas seria cansativo e desnecessário, todos já sabem o que há de errado - e não me refiro ao mensalão. Para ficar apenas no Rio de Janeiro, como a presidente Dilma ainda não se pronunciou diante da barbárie que vem sucessivamente sendo cometida aqui? O que o Mercadante espera para dar um nota que seja sobre o que o Eduardo Paes e o Sérgio Cabral estão fazendo com a Educação?
Para finalizar, aviso ao petistas, que temiam a volta do tucanato, para não se preocuparem: em São Paulo, por exemplo, Alckmin também foi e é alvo de protestos. Chegou a hora de entendermos, todos, que a luta não é contra um ou outro partido - a luta é contra o sistema, que continua privilegiando uma parcela ínfima da sociedade, a mesma que detém o capital. O que queremos é um governo que seja, de fato, preocupado com o povo, com o trabalhador. Mais, preferencialmente que estes trabalhadores - e não políticos profissionais, filhos da burguesia e perpetuadores do status quo - cheguem ao poder. Acredito que esteja na hora de substituirmos o capitalismo, que já demonstrou toda a sua iniquidade. Que venham Educação, Saúde, Transportes, Segurança, Moradia, Habitação, Alimentação padrão Fifa. Trocamos os suntuosos estádios de futebol por saúde e educação para começar. 

sábado, 20 de julho de 2013

Estamos no caminho certo?

Desde que as manifestações eclodiram por todo o país, aqui no Rio de Janeiro tivemos momentos muito expressivos, como as passeatas da Rio Branco e da Presidente Vargas, por exemplo. Nelas, também e infelizmente, houve repressão e violência policiais, mas havia muita gente nas ruas explicitando seu descontentamento com os rumos de nossa política.
As manifestações continuam a acontecer, mas cada vez mais o número de participantes é menor. Penso que essa diminuição revela que há alguma coisa de errado acontecendo. Por que as pessoas que encheram o centro do Rio têm optado por não mais sair às ruas? Por que mais e novos cidadãos não se sentem motivados a aderir aos protestos? 
Uma primeira e pronta resposta poderia ser a violência com a qual a PM tem reprimido os manifestantes e a repercussão negativa que os "vândalos" causam na opinião pública. É uma resposta possível, mas não me convence. Sou da opinião, aberta a mudanças, naturalmente, de que a forma com que os protestos se articulam não tem sido produtiva para ninguém. Talvez apenas para o governo, haja vista justamente a maneira inamistosa como a população em geral tem encarado os atos de "vandalismo". Não tenho a ilusão de que a maioria das pessoas acompanha o que de fato acontece à luz da imprensa alternativa, ao contrário do que pensam alguns amigos. Para mim, infelizmente, ainda é a imprensa institucionalizada quem filtra o que deve chegar ao público - e o filtro é extremamente tendencioso e de direita.
A grande imprensa já deixou claro de que lado está e, a cada confronto que houver com a polícia, mais munição disparamos contra nossos próprios pés. A meu ver, por mais legítimas que sejam as nossas reivindicações, precisamos urgentemente encontrar outra maneira de reclamá-las, pois o embate com a PM só tem nos enfraquecido. Penso que há uma necessidade premente de cooptarmos mais e mais pessoas para o nosso lado, de maneira a conseguirmos atingir as mudanças urgentes de que o país necessita - em uma palavra, temos que trabalhar, também, como formadores de opinião e, para isso surtir efeito, os confrontos precisam parar. Em hipótese alguma estou sugerindo que não devemos ir às ruas e que nos resta a resignação, mas creio que uma mudança de pauta é importante no momento. A repressão é a tônica em toda manifestação. A polícia não está presente para proteger a população, ao contrário, sua presença se dá para nos atacar e desmoralizar, o que tem sido muito bem feito com a pronta ajuda dos meios de comunicação.
Dessa maneira, o foco tem se desvirtuado. Ao invés de falarmos de nossas reivindicações originais - e são muitas -, perdemos tempo reclamando da truculência e do despreparo da polícia. Ao apontarmos o holofote para isso, desviamos a luz do que nos motivou a ir às ruas, e para o poder vigente isso é ótimo, seja porque é a direção apontada pela imprensa, seja porque é a revolta dos manifestantes. E aí desconfio que muitos dos manifestantes que ainda vão protestar o fazem catarticamente, de maneira a liberar o descontentamento e a indignação mais do que justas com o governo. Acho que é hora de repensarmos nossas pautas e as formas de protesto.
As manifestações organizadas em torno da visita do papa e da Jornada Mundial da Juventude, por um lado, darão muita visibilidade aos manifestantes, possivelmente pressionando mais ainda o governo de Sérgio Cabral, mas, por outro, um confronto com a polícia num evento, mais do que internacional, religioso num país predominantemente católico pode conferir à imprensa a pecha que faltava para assegurar a opinião pública de que não passamos de "vândalos" que nem o direito constitucional de escolha religiosa respeita. Enfim, reitero que precisamos agir mais com a cabeça do que com a força, mas ainda assim agir. 
Não faço parte de nenhum grupo, mas utilizo a primeira pessoa do plural porque concordo com as reivindicações gritadas nas ruas e porque, num confronto entre o povo e o governo, estarei sempre ao lado da população, dela faço parte e nosso inimigo é o mesmo. Este texto não pretende conter a verdade final sobre os fatos, estou aberto para dialogar e, caso julgue pertinente, mudar de ideia. Ele foi escrito, porém, porque, como já disse, acredito que estamos insistindo em prosseguir por um caminho que tem se mostrado ineficiente. Lembremo-nos que ano que vem haverá eleições e não podemos correr o risco de fortalecer o governo, mesmo que isso se dê (in)diretamente via opinião pública. 

sexta-feira, 12 de julho de 2013

Truculência de ambas as partes?

Relutei o quanto pude em vir aqui escrever sobre as manifestações que ocorrem pelo país à fora por três razões principais: i) quando os protestos iniciaram, acredito que todos ficamos sem saber ao certo como categorizar tanto os manifestantes, apartidários, sem líderes, e de várias frentes diversas, quanto as próprias manifestações em si. Muito se discutia a esse respeito, cientistas políticos e sociais, assim como intelectuais de diferentes áreas, buscavam uma reflexão que encontrasse respostas ao que acontecia no país, mas todas as teorizações ainda me pareciam insuficientes; ii) muito já havia sido escrito por pessoas com mais gabarito do que eu e não estava disposto a, simplesmente, repetir o já dito, reforçar as dúvidas para as quais ainda não havia respostas etc.; iii) como eu ainda não havia podido participar, diretamente, de nenhuma das manifestações aqui no Rio de Janeiro, sabendo das barbaridades cometidas pela polícia pelas redes sociais e pela Mídia Ninja, não me sentia apto a falar sobre o assunto. Era como se eu, agindo assim, pegasse carona na dor e militância alheias para, no conforto da minha casa, tecer argumentos sobre o modus operandi da polícia repressora e da população cansada e indignada. 
Hoje, porém, meu sentimento é outro. Não, não tenho uma resposta definitiva sobre as manifestações e acredito que não vou dizer nada de novo. Escrevo, porém, porque ainda dói. 
Morei por aproximadamente 27 anos na Rua Pinheiro Machado, em frente ao Palácio. Criança, frequentava o parquinho que havia lá e que cedeu espaço a um estacionamento. Ontem, não fui para uma diversão infantil, mas para contribuir com minha voz. A liberdade de expressão e manifestações contra o governo são legais, não? 
Ainda no Largo do Machado, a concentração transcorreu na mais perfeita ordem e, ordeira, seguiu pela Rua das Laranjeiras em direção ao Palácio. Duas coisas me chamaram atenção no caminho. A grande quantidade de pessoas nos apartamentos que apoiavam a manifestação, piscando as luzes de suas casas, foi um dado positivo. O negativo, por outro lado, foi o comércio fechando as portas às pressas, receosos do "vandalismo de uma minoria", como noticiam os telejornais. Sobre este último aspecto, tenho ouvido e conversado com pessoas que acreditam que há truculência de ambas as partes. Não sei se essa crença é embasada no noticiário, mas é um discurso que percebo bastante ressonante ainda. Ora, é sabido que, entre os manifestantes, há grupos de extrema-direita dispostos ao enfrentamento, como provavelmente também há gente infiltrada para desestabilizar e enfraquecer o movimento. As notícias veiculadas pela mídia televisiva, em especial a Rede Globo, é de que a polícia apenas reage a um primeiro ataque vindo dos manifestantes e age apenas para dispersar a multidão. Isso é mentira! Mesmo que o primeiro ataque de fato parta da população, a reação da PM não é demasiada arbitrária? Ademais, os mantenedores da lei e da ordem estão equipados dos pés a cabeça, possuem armas letais e escudos, além de carros, motos, blindados, em contraste com os "vândalos".
Mas se há, no meio dos participantes, gente de extrema-direita e/ou extrema-esquerda, engrossando o coro contra o governo do senhor Sérgio Cabral, penso que isso é um sinal ainda mais assustador. Haveria alguém contente com seu governo?! Tenho grande curiosidade em saber o que pensa a maioria da população, sem uma conscientização política e, portanto, mais facilmente manipulada, sobre o referido governo. Por mais gente que vá às ruas, a grande maioria da população permanece em suas residências e não tem acesso às  redes sociais ou à cobertura feita pela mídia alternativa, que vem dando um espetáculo. E, para piorar, essa massa tem um acesso distorcido do que ocorre nas manifestações pela grande imprensa. Será que a retomada do espaço anteriormente ocupado pelo narcotráfico já é um indício, para parte da população, de que o governo é bom e está ao lado do povo? Será que a Copa e as Olimpíadas são consideradas marcos de uma vitória do governo em prol da população? No caso das UPPs, o buraco é mais embaixo. Se houve realmente uma retomada do espaço, por que o tráfico ainda persiste? Por que o senhor Beltrame dizia, sempre que podia, não ser prioridade da polícia acabar com o tráfico? Por que não? A quem o tráfico interessa, no final das contas? Honestamente, gostaria muito de saber o que as pessoas que não vão às ruas acham.
Independente do que possam pensar as pessoas que não saem às ruas para protestar, muita gente tem saído. Ontem à noite, um grupo estava em frente ao Palácio Guanabara. Não havia, como era de se esperar, nenhum representante para dialogar, apenas tentativas inúteis de um oficial (não sei sua patente) em dizer, com um megafone cujo som era muito baixo, que estava ao nosso lado. Desconfio, inclusive, que isso não passou de manobra midiática, pois vi na televisão (Globo) o referido policial discursando como se realmente se importasse conosco. Tudo ia bem até que, de uma hora para outra, começou o enfrentamento. Posso estar enganado, mas desconfio que partiu de fato dos manifestantes o primeiro rojão contra os policiais, que rapidamente agiram não de maneira a dispersar a multidão, mas de nos exterminar, essa era a impressão. (Breve parênteses: quando desconfio que saiu da parte dos manifestantes, me refiro a um grupo específico e, em hipótese alguma, coloco todos sob o mesmo paradigma). O trecho da Rua Paissandu entre as Ruas Pinheiro Machado e Ipiranga foi bloqueado pela PM, impedindo justamente que nos dispersássemos. Ficamos encurralados e, mesmo assim, bombas, tiros e muito gás não paravam de ser lançados.
Hoje, conversei com algumas pessoas que se referiram, mais uma vez, à truculência de ambas as partes, pelo simples fato de lixeiras terem sido queimadas. Bem, elas foram queimadas como uma tentativa de barricada, para que pudéssemos fugir, o que se mostrou ineficiente porque a PM seguia adiante com motos, lançando mais bombas, tiros e gás. De volta à Pinheiro Machado, fomos atacados por um carro sem nenhuma identificação que disparou inúmeras bombas, enquanto as motos continuavam a perseguição, que se estendeu por Botafogo, Flamengo e Laranjeiras. Truculência de ambas as partes? Não, isso não aconteceu. A polícia agiu assim, tacando bombas (!!) em hospitais, em bares, em residências e em manifestantes (!!) Definitivamente, não posso concordar que houve truculência de ambas as partes. 
Nasci em 1974, em plena ditadura militar, mas não vivi o horror daquela época, era tão-somente uma criança, mas, enquanto fugia pelas ruas noite passada, sendo caçado, acuado e oprimido, me perguntava se de fato vivemos numa democracia. Vivemos? O que explica o governador do segundo mais importante estado do país ordenar a barbárie em plena cidade, aos olhos do tráfego e dos moradores no alto dos prédios, que assistiam a tudo horrorizados? É inaceitável que ele apenas diga que lamenta a ação de vândalos isolados, como é inaceitável o completo silêncio dos meios de comunicação. 
Até pouquíssimo tempo atrás, a PM restringia sua violência e covardia às favelas e fingíamos que nada víamos. Acontece que não estamos mais dispostos a fechar os olhos seja para onde for. A classe média, especialmente da zona sul, sempre foi poupada das arbitrariedades de nossa polícia, uma pena, visto que o tratamento deveria ser o mesmo para todos. Nem mais ela, porém, está a salvo agora. A repressão está sendo democraticamente oferecida a toda a população, da Maré ao Leblon. Só que não estamos mais interessados em, dia após dia, assistirmos ao que nossos políticos fazem com resignação. Não, chega! Não queremos Copa do Mundo, queremos dignidade; educação; saúde; transporte; moradia; alimentação. E não queremos padrão Fifa, queremos à brasileira mesmo, desde que reconstruamos nosso país, que consigamos finalmente reformas políticas e representantes dignos de ocuparem seus cargos. Lamentavelmente não é isso o que ocorre, desde sempre. Cansamos. E estamos dispostos a prosseguir. Sem a truculência da qual nos acusam, esta é parte da PM, subordinada ao governo do estado, fique claro. 
Enfim, escrevo este texto porque ainda dói. As lembranças ainda são muito recentes e a dor não é física. A violência da polícia ontem, como nas demais manifestações, nada mais é do que o reflexo da violência de nosso governo. Não estão satisfeitos, parece querer dizer o senhor Sérgio Cabral, acabem com eles. Escrevo porque dói, porque estou indignado e porque, agora, não me resta outra coisa a fazer. Já era hora deste blog bastardo ser reativado mesmo.

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Aos bicicleteiros

Ok, o mundo não acabou, mas passa por dificuldades. Há desmatamentos, superaquecimento, espécies vegetais e animais em risco de extinção, catástrofes ocasionadas por ocupações irregulares e por descaso das autoridades etc. Além disso, o trânsito das grandes cidades está cada vez mais caótico e, dia a dia, um grupo mais consciente dos benefícios que as bicicletas proporcionariam à qualidade de vida vem reivindicando mais atenção, respeito e consciência dos veículos motorizados para com os ciclistas. Apoio a causa e, numa cidade como o Rio de Janeiro, por exemplo, o uso das bicicletas como meio de transporte tem tudo para dar certo. Possuímos quilômetros de ciclovias e algumas estações de metrô já têm bicicletários, facilitando assim a vida dos ciclistas e, por conseguinte, de toda a população. Seriam menos carros, menos buzinas, menos engarrafamentos, menos poluição e mais bem-estar para todos, ciclistas ou não.
Mas aqui, apesar de ser simpático à causa e gostar da ideia de se ter mais respeito pelas magrelas no trânsito, com uma legislação mais clara e uma política que eduque e puna os desrespeitosos, quero chamar atenção para o lado mais fraco e desde sempre menos favorecido das nossas ruas - o pedestre. Onde eu moro e nas adjacências (Flamengo, Largo do Machado, Laranjeiras, Catete, Glória e Botafogo), é raríssimo observar um ciclista cumprindo as leis de trânsito. O sinal vermelho, na cabeça de quase todos os ciclistas, deve ser respeitado apenas pelos veículos motorizados, assim como andar na contramão parece ser um direito das bicicletas, sem falar em andar pela calçada, uma extensão de liberdade e caminho para pedaladas.
Conheço alguns casos de amigos próximos que já sofreram com o egocentrismo dos ciclistas. Uma amiga, indo buscar a filha no colégio, ao atravessar a rua, foi atropelada por uma bicicleta que vinha na contramão e precisou ir ao hospital; um outro amigo, maratonista, já foi também atropelado por outro ciclista enquanto treinava para a maratona de Porto Alegre e teve seu braço quebrado, perdendo a prova; eu mesmo, que gosto de correr no aterro, já fui diversas vezes hostilizado por ciclistas que parecem ignorar que a preferência, mesmo nas ciclovias, é do pedestre. Já precisei, mais de uma vez, puxar minhas filhas para que as pequenas não se machucassem.
Não pretendo, em hipótese alguma, diminuir a importância das reivindicações dos ciclistas. Como já disse, apoio a causa. Também tenho consciência de que há muitos bicicleteiros que respeitam as leis de trânsito e pedalam respeitando para também serem respeitados. Como tenho amigos que já sofreram com as bicicletas, também tenho amigos que não só pedalam dentro do que esperamos de uma sociedade civilizada, mas que militam para uma boa educação no trânsito, independente do meio de transporte.
Que as autoridades pensem com mais carinho nas bicicletas como uma alternativa muito viável para o transporte urbano;que os motoristas respeitem os ciclistas e conscientizem-se de que há espaço para todos; que os próprios ciclistas passem a respeitar as leis de trânsito e se lembrem que assim como têm direitos, devem ter igualmente deveres; e que nós pedestres possamos transitar seguros.

sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

A verdade dos fatos

Senão vejamos. O metrô do Rio de Janeiro aumentou consideravelmente a quantidade de cidadãos que já podem se beneficiar com mais este excelente meio de transporte público. Quando criança, recordo-me que as estações da linha 1 iam de Botafogo à Saens Peña e umas poucas na linha 2. Hoje, além de várias novas estações, temos o metrô na superfície e outras tantas integrações, possibilitando ao usuário chegar a bairros por onde o metrô não passa. Um avanço muito grande em termos de transporte público, evidenciando o empenho de nosso governador pelo bem-estar da população.
É claro que sempre há e haverá os descontentes. Não basta se locomover com presteza, mas, se não houver ar-condicionado, o cordão dos reclamões põe a boca no trombone e a imprensa faz alarde de tão pequenino revés. Há ainda aqueles que pretendem se sentar após uma jornada de trabalho cansativa. Estes, porém, deveriam agradecer ter um trabalho, que afinal engrandece e dignifica o homem. O bilhete do metrô, a propósito, garante o transporte, não o conforto. Para quem está em busca de ar-condicionado, lugares vazios ou minimamente mais espaço numa viagem forçosamente em pé, mais empenho nos estudos e no trabalho redundaria em mais dinheiro e, em consequência, no poder financeiro para a compra de um automóvel ou o transporte via taxi. Não é possível que a população não enxergue como se articulam em prol de cada um de nós as políticas públicas. Tenho certeza, também, que se oferecerem preços mais caros para aqueles que pretedem viajar sentados, haverá a turma da oposição para prontamente reclamar, o que é de costume. Mas em todos os lugares não é assim? Os melhores lugares são sempre mais caros, ora.
Mas, para ficar apenas no que diz respeito ao metrô e ao transporte em massa e finalizar esses breves comentários, por que a imprensa não noticia o óbvio, ao invés de apontar defeitos inexistentes? O último absurdo noticiado foi a tentativa dos seguranças do metrô de garantirem viagem segura aos usuários, empurrando-os para dentro do vagão superlotado a fim de que a porta fechasse sem pôr em risco os viajantes. Que bom que há essa preocupação. Para quem quer mais espaço e continuar a usufruir do metrô, um bom regime seria uma solução, diminuindo assim os gastos com cerveja e sardinha, por exemplo. Mais uma demonstração da coadunação de nossas políticas públicas em todas as áreas, sempre a favorecer a população. No final das contas, a culpa é sempre da população, pois nossos governantes só não utilizam o transporte público para não ocupar o lugar do trabalhador. Nisso ninguém pensa e a imprensa faz vista grossa. Ou vocês não acham que o Sérgio Cabral adoraria trocar seu carro de luxo com motorista para se juntar aos eleitores que o elegeram para um segundo mandato. Ele adoraria viajar em companhia de seus eleitores, que certamente demonstrariam todo afeto e carinho que ele merece. Alguma dúvida?